domingo, 12 de fevereiro de 2017

Contratos de aluguel - alguns direitos

O aluguel de imóveis urbanos é uma das relações de direito privado mais comuns na vida cotidiana. Por esse motivo, a nossa legislação trata de forma bastante detalhada sobre o assunto, definindo direitos, deveres e regras de observância obrigatória na pactuação e na execução desse tipo de contrato.

A lei especial que rege o tema é a 8.245, de 1991 - a famigerada 'Lei do Inquilinato' (LI) -, com regência supletiva pelo Código Civil de 2002 (art. 565 e seguintes).

Nesse artigo, vou tratar de alguns direitos importantes em relação aos contratos de locação imobiliária, mas que são pouco difundidos.

Da cobrança de aluguéis antecipados


É uma prática bastante comum, por parte dos locadores, a cobrança de aluguéis antecipados.

No entanto, o que pouca gente sabe é que esse ato é ilegal (art. 20 da LI). Mais do que isso: trata-se de uma contravenção penal, punível com prisão, de 5 dias a 6 meses, ou multa, no valor de 3 a 12 meses de aluguel (art. 43, incisos I e III, da LI).

A cobrança antecipada só é permitida nos aluguéis por temporada (aqueles com duração de até 90 dias e para fins de lazer, entre outros) ou nos casos em que não há nenhuma outra garantia estabelecida no contrato.

A propósito, as únicas garantias locatícias permitidas pela Lei do Inquilinato são as seguintes (art. 37):
  1. caução;
  2. fiança;
  3. seguro de fiança locatícia;
  4. cessão fiduciária de cotas de fundo de investimento.
É importante salientar que o locador só pode exigir uma modalidade de garantia no contrato, ao mesmo tempo. A cumulação de garantias também é considerada contravenção penal (art. 43, inciso II, LI).

Logo, o que a lei permite é que se cobre caução, no valor equivalente a até 3 aluguéis, como forma de garantia, devendo tal valor ser devolvido ao final da locação. De qualquer modo, caso o locador se utilize dessa espécie de garantia, não poderá exigir outra, como fiança, por exemplo.

Da possibilidade de revisão do valor do aluguel


É sabido que os contratos de aluguel podem ser reajustados anualmente, conforme índice de inflação definido no contrato (geralmente, o IGP-M).

Porém, além desse reajuste inflacionário anual, a Lei do Inquilinato prevê também a possibilidade de revisão do valor do aluguel a cada 3 anos, a fim de adequá-lo ao preço praticado no mercado (art. 19 da LI).

Significa dizer que o valor da locação não é imutável durante a vigência do contrato, atrelado apenas à variação geral da inflação. Com efeito, caso haja uma variação substancial no mercado imobiliário, em especial (geralmente, alterações grandes na oferta e/ou na procura), que altere significativamente os valores praticados, será possível a revisão dos valores dos contratos vigentes.

Se essa revisão não ocorrer de comum acordo entre locador e locatário, poderá ser pleiteada judicialmente, através de um advogado, sendo manejada a competente ação revisional de aluguel (art. 68 e seguintes da LI). Nessa ação, tanto o locador pode solicitar o aumento do aluguel, como o locatário, a diminuição daquele. Há de se comprovar a alteração mercadológica ensejadora do novo valor pretendido.

Do risco dos contratos verbais ou inferiores a 30 meses


Nunca é demais lembrar que a melhor forma de se evitar problemas é documentar devidamente suas relações negociais. Com o "preto no branco", fica muito mais fácil provar a verdade dos fatos, seja em juízo ou fora dele.

No que tange aos contratos de locação, a avença por escrito se demonstra ainda mais importante.

Em regra, nos aluguéis residenciais, caso vença o prazo de locação originalmente combinado sem que nenhuma das partes solicite a desocupação do imóvel, o contrato fica automaticamente renovado, nas mesmas condições, por tempo indeterminado. A partir daí, o locador pode solicitar a qualquer momento a desocupação, desde que conceda prazo de 30 dias para isso.

Porém, caso a avença seja feita verbalmente ou por escrito, mas com prazo inferior a 30 meses, o direito do locador reaver o imóvel fica bastante mitigado.

Nessas hipóteses, a desocupação só pode ser requerida caso se trate de algumas situações específicas, previstas no art. 47 da Lei do Inquilinato. Fora dos casos vaticinados, a retomada é impossível. Significa dizer que, para prestigiar os contratos escritos e as locações de longo prazo, o legislador decidiu punir os locadores que agem de modo diverso.

Sendo assim, é extremamente recomendável que sempre se formalize as locações de imóveis através de contratos escritos, elaborados com o auxílio de um advogado.

Do direito de renovação obrigatória dos contratos de locação comercial


Quando se é inquilino, um fator bastante importante e que normalmente se deseja é a segurança e a estabilidade da relação locatícia. Ninguém gosta de ser pego de surpresa e ter que se mudar, só porque o dono do imóvel, seja por interesse financeiro ou por capricho, deseja trocar de locatário ou retomar o imóvel.

Nos aluguéis comerciais, esse fator é ainda mais grave, pois boa parte do sucesso do negócio pode estar relacionada à localização física do estabelecimento.

Nesse sentido, a Lei do Inquilinato prevê o direito de renovação obrigatória do contrato nas locações não residenciais (art. 51).

Para tanto, é necessário preencher alguns requisitos, como: haver contrato escrito; vigência da locação por pelo menos 5 anos; 3 anos ou mais de exploração comercial do ponto etc.

Preenchidos todos os requisitos ensejadores do direito, caso o locador se negue a renovar a avença, é cabível a competente ação renovatória (art. 71 e seguintes da LI), a ser manejada por advogado.

Porém, atenção: essa ação deve ser proposta, obrigatoriamente, no período entre 1 ano e 6 meses antes do fim do contrato vigente, sob pena de caducidade do direito (art. 51, § 5º, da LI).

Do direito de preferência e da cláusula de vigência do contrato em caso de alienação do imóvel


Por fim, um fato que costuma tirar o sono de muitos inquilinos: a venda do imóvel locado a terceiros.

Com efeito, quando o locador resolve vender o bem, inaugura-se uma situação de bastante insegurança para o locatário.

Porém, a Lei do Inquilinato prevê duas garantias para o ocupante do imóvel à venda:
  1. o direito de preferência na compra; e
  2. a vigência do contrato, até seu término, desde que expressamente previsto em contrato.
No primeiro caso (art. 27 e seguintes, da LI), deve o locatário ser comunicado por escrito da intenção de venda, sendo informados o valor e as condições oferecidas pelo promitente comprador, para que possa, em 30 dias, manifestar seu objetivo de adquirir ou não o imóvel nas mesmas condições.

Caso opte por não exercer seu direito de preferência, o locatário deverá ser notificado pelo adquirente para desocupar o imóvel em até 90 dias, caso este não tenha interesse em manter o contrato de locação.

Já no segundo caso, existe a possibilidade de se exigir do adquirente o respeito ao prazo de locação contratualmente previsto, até seu final. Porém, tal direito só é oponível se expressamente previsto em cláusula específica no contrato de locação, devendo o instrumento ser averbado na matrícula do imóvel, para que se respeite o princípio da publicidade perante terceiros (art. 8º da LI).

Por isso, sempre procure um advogado antes de realizar uma locação. A orientação profissional adequada pode prevenir inúmeros dissabores.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

A ética social está nua!

É cada vez mais comum a divulgação de fotos íntimas de pessoas através das redes sociais. Os motivos são os mais diversos: pornografia de revanche, “sexting” malsucedido etc. O fato é que há uma ideia geral de que as vítimas são, na verdade, as culpadas. “Ninguém mandou tirar foto nua”, argumentam os disseminadores das fotos e vídeos, como se essa escusa legitimasse o ato difamatório.

Esse novo fenômeno social é mais sério do que se pensa. Pode, a princípio, parecer um erro que pessoas se exponham ao ponto de posarem para fotos e vídeos de cunho erótico – desnecessário dizer que se trata, por óbvio, de uma conduta arriscada, quando a divulgação do material não é o que se pretende; porém, muitas vezes, essas imagens são produzidas em um contexto de intimidade e confiança - e, afinal, nudez e sexo, quando íntimos, não são nenhuma aberração ou crime. O resultado da divulgação e do compartilhamento irresponsáveis desses materiais costuma ser grave: pessoas desenvolvem problemas psicológicos, perdem o emprego, são obrigadas a se mudarem de cidade e, em casos mais extremos, como o de Júlia, de Parnaíba (PI), e de Giana, de Veranópolis (RS), ocorridos no final de 2013, as vítimas podem até cometer suicídio, por não suportarem o peso da humilhação pública.

Hoje, não há um tipo penal específico prevendo essa conduta (qual seja, a de divulgar e compartilhar fotos e vídeos íntimos de outrem.) A Lei Carolina Dieckmann (12.737/12) criminaliza apenas o furto de informações digitais, sem, contudo, tratar da disseminação dos arquivos. Há um projeto de lei tramitando na Câmara (PL 6.630/13), de autoria do deputado Romário (PSB/RJ), que altera o Código Penal, tipificando a conduta de “divulgar fotos ou vídeos com cena de nudez ou ato sexual, sem autorização da vítima” como crime, com pena prevista de um a três anos de detenção e multa, além de trazer para a esfera penal o ressarcimento específico das despesas com mudança de domicílio e/ou de instituição de ensino, com tratamentos médicos e psicológicos e decorrentes da perda de emprego pela vítima. Enquanto não é aprovada uma lei sobre o assunto, as condutas lesivas podem ser encaixadas em outros tipos penais, como, por exemplo, o crime de difamação, ficando, porém, mais difícil de se obter uma condenação no âmbito penal.

Há, também, as consequências cíveis - essas, independem de lei específica. Provada a participação de um indivíduo na divulgação de fotos ou vídeos sem a autorização da vítima e com intuito pejorativo, cabe pedido judicial de reparação pelos danos morais sofridos em decorrência do ato ilícito, consoante previsto no Código Civil brasileiro. Em fevereiro de 2013, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou um homem a pagar 50 mil reais de indenização a uma pedagoga, por ele ter divulgado fotos íntimas dela - que era sua ex namorada - por e-mail.

Os meios tecnológicos atuais também favorecem a ridicularização pública – com smartphones, internet móvel e aplicativos de mensagens cada vez mais popularizados, a disseminação de fotos e vídeos ilícitos é especialmente ampla, rápida e irreversível, de forma que, em pouco tempo, todos os círculos sociais das vítimas acabam tendo acesso aos arquivos. Independentemente das consequências jurídicas, é urgente que a sociedade repense seus princípios éticos. Antes de prejudicar gratuitamente as pessoas, os indivíduos têm que ter em mente a gravidade das consequências de suas atitudes, bem como do mal que estão causando às vítimas – este último é, obviamente, muito superior à suposta “falta moral” cometida pela vítima. Pense nisso antes de dar o próximo ‘encaminhar’ no Whatsapp.